segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Última parada

Escrito por Rafael Guedes



Candeias do Jamari

Penúltimo dia da turnê Flor no Norte (dependendo do ponto de vista, alguns ainda ficarão 4 dias dentro do ônibus de volta pra casa...). Fomos conhecer a cidade de Candeias do Jamari, localidade a cerca de 30 minutos de Porto Velho. Chegando à cidade, tudo tranquilo, véspera de aniversário da cidade. Fomos direto ao rio Candeias, onde demos de cara com um belo cenário. Um local calmo, bonito e com a energia necessária para o momento de fechar um ciclo e voltar pra casa. Também almoçamos por lá, um belo peixe preparado pela tia da barraca na beira do rio, onde também havia uma Jukebox, que embalou o dia com todo tipo de música. Depois desse dia, tivemos mais um dia pra organizar as coisas no hotel e nos prepararmos para a apresentação.
Chegou o momento, uma mistura de sensações: última apresentação da turnê, voltando pra casa, vou ficar com saudade dessa viagem, e uma puta sensação de que realizamos com resultados maravilhosos essa turnê na Região Norte. Pra minha surpresa, em pleno aniversário de 22 anos da cidade, ela se encontrava pacata, sem grandes comemorações, as pessoas dentro de casa, algumas pelas lanchonetes... e o meu pensamento era: “nada, já já chega a galera aí!” Como o teatro de rua é novo em minha vida (apenas 2 anos de prática), acredito ser necessário vivenciar as milhares de situações que ele nos proporciona. Foi uma plateia de 80 a 100 pessoas, pode-se dizer a menor da turnê. Mas ali, apesar de todo o cansaço, da ansiedade de voltar pra casa, me dei conta mais uma vez da magia do teatro de rua. Não importava se estavam ali 80 pessoas ou 800, a história iria ser contada, a minha vida iria ser modificada.
Apenas poucos minutos de peça e Rebeca – a cachorrinha que defendeu Catirina e Mateus do Bicheiro e seus comparsas – entra em cena; tinha também um senhor que sentou à frente, feliz da vida com o nosso trabalho, e com os olhos cheios de lágrimas pediu para tirar uma foto e nos falou um pouco de sua vida ao final de tudo. E teve o garoto que veio pedir desculpas por sua cachorra ter entrado em cena, e aquele povo todo dando risadas durante o espetáculo.
Percebo que o Brasil é um “mundão”, injusto com seu povo. Que o Ser Tão Teatro realiza algo verdadeiro, e sai do eixo – descentralizando e levando cultura e arte pra lugares longíquos. Trocando com muitos que são esquecidos ou deixados de lado por acomodação de tantos. O Brasil é cheio de gente “Top” que, de tão top, só transparece arrogância e prepotência. Infelizmente... Fico com o dia 13 de fevereiro em minha alma, buscando os ensinamentos que esta vivência quis me passar. É preciso coragem, força e muito amor no dia-a-dia – o Norte me mostrou isso. E Candeias do Jamari me disse muito mais, com todo o seu silêncio. Que privilegiado eu sou! Entrar nesses desafios do Ser Tão Teatro, trocando com as pessoas por onde passamos, buscando fazer o nosso melhor. Ter a satisfação em saber que de algum modo podemos “mudar” um dia que seja dessas comunidades.
O teatro tem muito a me ensinar, ao teatro muito ainda tenho a dar...




sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

Última parada: Rondônia

Registros em Porto Velho, capital de Rondônia

Fotos de Christina Streva












Apresentação em Porto Velho, Rondônia


Apresentação em Porto Velho, Rondônia

Como gota na imensidão do rio

Escrito por Christina Streva

Final de turnê. Última folga antes da apresentação em Candeias do Jamari. De lá, voltamos direto para casa. Foram 10.000 rodados, 11 cidades, 7 estados, 4 oficinas, 36 dias, montagens e desmontagens, deslocamentos, euforia, cantoria, cansaço, silêncio, alegria, encontros, trocas, tensões, tesões, harmonia. Aos poucos, a leveza vai invadindo o ambiente novamente. O grupo, que andava exausto e estressado por causa do atraso do cenário e de uma série de imprevistos burocráticos, agora, está calmo e harmonizado. A sensação de dever cumprido já se mistura a uma mansa melancolia. Sentimento de realização, de construção e de contribuição para algo precioso. O que, exatamente? Difícil explicar e quase impossível mensurar. Algo sutil e misterioso, praticamente imperceptível como as pequenas gotas d´água na imensidão e na abundância dos rios amazônicos. Mas algo que se revela em momentos preciosos - como no sorriso da criança que corre para os nossos braços no final da peça; nos indígenas que, inicialmente desconfiados, entrelaçam suas mãos às nossas para dançarem conosco a ciranda final; no brilho dos olhos jovens dos estudantes quando nos dizem nas oficinas que nos tornamos uma inspiração para eles; na risada alta e gostosa do pipoqueiro que, ao nos ver guardar o material após o espetáculo, diz: “puxa vida! Mas só gostando muito do que se faz para carregar esse peso todo e enfrentar tanta estrada, não é não?”13 artistas, alguns agregados e muitas imperfeições. Cada qual lidando com suas próprias dificuldades, sua própria solidão. Por entre esse Brasil imenso, também tão imperfeito e desigual. 13 pessoas que encontram algo que vale a pena fazer. Que torna a vida melhor, mais suportável, mais criativa. Que nos garante um sentido de existência. E que também exige muito de nós. Compreensão, alteridade, flexibilidade. Acima de tudo, nos exige o tempo todo que nos tornemos indivíduos melhores. E o teatro! Com seu poder inigualável de promover encontros, de desarmar as pessoas, de aproximar, emocionar e afetar. A nós mesmos e a muitos que cruzam nosso caminho. No meio disso tudo, a eterna apreensão com relação ao futuro. Alguém terá visto? Alguém se importa? Alguém percebe ou sente assim como nós? E, agora, o que virá? Já sabemos. Recomeçaremos do zero, esperando, torcendo, criando estratégias, inventando meios, cavando oportunidades para que, de alguma forma, o Ser Tão possa continuar. 
Até a próxima!